Em Lobitos a água é gelada, o mar avança sobre uma bancada de areia e pedras. Na maré baixa, a profundidade limita-se a poucos centímetros e algumas rochas ficam expostas. Há um deserto com algumas colinas, onde antigas bombas de extração de petróleo, hoje enferrujadas e obsoletas, se assemelham aos restos de algum grande desastre, como se ali, em tempos imemoriais, tivessem caído os fragmentos de uma imensa maquinaria celeste, após seu colapso. Casas de um povoado fantasma aguardam com suas portas e janelas abertas. Frequentemente o vento as visita, sobretudo no final da tarde, com a luz do sol atravessada pelas frinchas das paredes. Nesses momentos, através dessas faixas de luz, podemos ver uma infinidade de partículas leves, suspensas no ar. Se desatentos, poderíamos facilmente confundir a maioria delas com partículas de poeira ou com os minúsculos grãos de areia que, desgastados por milênios de insignificante viagem, então se desprendem do chão com o sopro que vem do sul. Mas a verdade é que essas partículas são radicalmente estranhas, como se sua única propriedade positiva se manifestasse pela impossibilidade de haver um nome próprio para elas. Seria mais fácil a tarefa de dizer infinitamente o que elas não são. Porque mesmo esse nome, “partículas”, não lhes serve em nada, já que suas formas e dimensões variam tanto que poderíamos desacreditar que algumas delas, bem grandes, flutuam; e muitas outras, com exóticas protuberâncias e reentrâncias absconsas, alentariam quem defendesse, por exemplo, a sua não-unidade, sugerindo uma formação a partir de espécies coloniais em trânsito: como se fossem corais feitos de colônias de corais, partículas feitas de partículas, de outras partes. Assim, o que vemos nessas faixas de luz são coisas diversas, coisas sem nome, coisas resistentes, coisas. Pois na melhor das hipóteses são isso mesmo: coisas que são, ou ainda, coisas que não.
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