quarta-feira, 25 de maio de 2011

311 - das condições de leitura, 19


Ao fundo, o Morro da Cabrita, em Santana de Cuparaquem. Ele se mostra imponente: um platô de altitude acentuada que termina, na margem leste, num acidente abrupto, caracterizado por uma parede vertical de rocha exposta, com poucas saliências, de cerca de 1.800 metros de altura. Há séculos, era uma espécie de refúgio para as tribos autóctones, território que servia para seus ritos de passagem: ali celebravam a vida e a morte, o amor e a guerra. Mas isso é passado distante. Nos anos 60 e 70 do século XX, o lugar já era buscado apenas por grupos de jovens urbanos, todos sem rumo, que elegiam o inóspito e inacessível como espaço propício para o consumo das drogas e do amor à mão. Nas últimas décadas, no entanto, observou-se que houve maior controle e discernimento: vários especialistas passaram a frequentar o local; entre eles: alpinistas, geólogos, ecologistas, naturalistas, topógrafos, meteorologistas, ufólogos, maconheiros, curandeiros, sexólogos, terapeutas, biólogos, empresários, trilheiros, arquitetos, esotéricos, políticos, artistas, exilados, fugitivos, criminosos e antropólogos (estes últimos por causa das tribos de criminosos, maconheiros, ufólogos, curandeiros, naturalistas, sexólogos, esotéricos, alpinistas etc. etc.). De modo que, podemos dizer, o lugar mudou de platô a plano; ou, para usar um tipo de construção muito recorrente entre os jornalistas mais espertos (especialistas também presentes no local), o Morro da Cabrita, em Santana de Cuparaquem, já não salta livre por aí: virou animal doméstico.


Nenhum comentário: