terça-feira, 6 de setembro de 2011

415 - das passagens, 28



Neste exato momento, tenho cãibras no lado esquerdo da testa. Olhando no espelho, é como se enfim eu tivesse a coordenação necessária para erguer apenas uma das sobrancelhas. Mas o involuntário do movimento (e sua repetição) empresta à cena algo de ridículo, de doentio, de demoníaco ou de absolutamente ordinário: com a cara meio embasbacada e inerte, fico esperando quando virá à tona, nessa minha testa, a próxima série de contrações, comandada – é o que parece – por um corpo estranho, ao menos por uma vontade que não é minha e me surpreende. Finalmente, levantando a sobrancelha esquerda mais uma vez (e mais uma e outra e outra... e outra), como se num acesso de perspicácia, baixo a vista e, meio perdido, penso quantas vezes já não se terá contraído, sem eu querer, esse coração aqui. E já nem sei se devo dizer assim, que o meu coração bate alheio. Acho que só pode bater tanto, mesmo, porque ele é alheio, porque não depende de mim.