terça-feira, 18 de janeiro de 2011

185 – das biografias, 30



Ela pensa num banco de areia, na luz do meio dia, numa palavra dura: em qualquer coisa capaz de interromper o fluxo. Quando veste seu vestido mais branco, duas alças passando sobre os ombros, entre elas um pescoço fino se ergue. Aí lembra daquele livro que fala de modo tão engraçado de uma mulher-girafa. O narrador não dá nome a essa personagem, mas compõe com o nome girafa um adjetivo para a mulher, que sem essa identificação poderia ser qualquer uma. Mas mesmo assim talvez não a reconhecesse na rua. Talvez a mulher-girafa, essa criatura tão idiossincrática (por que foi pensar nessa palavra?), passasse bem ao seu lado sem ser notada, como mais um elemento à toa criado pela cidade. Então de que adianta, afinal, esse nome tão preciso? Não serve para nada. Ela gostaria de ter escrito esse livro. Se perguntassem uma coisa que ela definitivamente gostaria de ter feito na vida, responderia: gostaria de ter escrito esse livro. É a maneira como ele flui, as voltas que cria, remansos, penumbras, um desapego sem fim. Como desejar algo que não seja seu contrário? Ela agora experimenta uma malha escura, de fio grosso, com uma gola alta que se dobra sobre si.


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